O fanatismo e suas consequências



Madureira é um bairro pulsante, multicultural, conhecido como o "Berço do Samba". Lá se encontram duas das mais tradicionais escolas de samba do Rio de Janeiro e o famoso baile charme sob o Viaduto Negrão de Lima, entre outras atrações. É também o lar do Mercadão de Madureira, o maior mercado popular do Brasil. Foi ali que esta história aconteceu.

Desempregado e me esforçando para honrar meus compromissos, como todo brasileiro eu buscava alternativas para sobreviver. Vendia picolés em casa e nas ruas, além de pipas, linhas, rabiolas e outras bugigangas. Grande parte desse material eu comprava no Mercadão.

Nas minhas contas, sempre sobrava uma pequena folga. Era o suficiente para um pedaço de torresmo e duas cervejas, pretexto para boas conversas no bar do subsolo do Mercadão – antes do incêndio de 2000. As conversas geralmente giravam em torno de futebol, uma das minhas paixões. Embora não fosse nenhum craque, como jogador mediano - de peladas, mas também de campeonatos de uma fábrica, onde trabalhei - eu tinha um bom conhecimento do assunto.

Durante uma dessas conversas, um dos frequentadores, torcedor declarado do Flamengo, elogiou meu entendimento sobre futebol, mesmo sabendo que eu era botafoguense. Com entusiasmo, ele tirou um álbum surrado de uma sacola e começou a nos mostrar fotos suas ao lado de Zico, Adílio, Nunes e outros ídolos rubro-negros. Orgulhoso, contava que ia a quase todos os jogos, inclusive os fora do Rio de Janeiro.

No entanto, o rumo da conversa começou a me inquietar. Ele relatava, também com orgulho, que trabalhava como soldador e que “queimava os olhos” – sim, sem usar óculos de proteção – para conseguir atestados médicos que lhe permitissem faltar ao trabalho e acompanhar o Flamengo. Falou disso com tanto fervor que eu mal sabia como reagir.

Por fim, com um olhar triste, revelou que hoje sofria de problemas sérios de visão e que a Previdência Social não reconhecia sua condição para a aposentadoria. A paixão que antes sustentava sua narrativa agora parecia ter virado um fardo.

Foi nesse momento que, estrategicamente, me preparei para ir embora. Cumprimentei todos, paguei minha conta e peguei minhas mercadorias. No caminho de casa, não consegui parar de refletir sobre o que presenciei. É incrível como o fanatismo, em qualquer área, pode levar as pessoas a decisões que sacrificam sua própria dignidade e saúde.

Link interessante:
https://oglobo.globo.com/rio/noticia/2025/01/03/baile-charme-de-madureira-e-destaque-no-new-york-times-como-simbolo-da-identidade-e-da-cultura-negra.ghtml


Mercadão antigo de Madureira - 1982, foto extraída da página Rio Antigo, no X.

Uma pausa para os comerciais...

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Comentários

  1. Lamentável mesmo como pensa e age o ser humano. Triste realidade, mas grande sua experiência. 👏🏻👏🏻👏🏻

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    1. Apenas um dos exemplos de como o fanatismo toma o lugar do amor próprio no ser humano. Grato pelo comentário, meu amigo.

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  2. A onde o fanatismo pode chegar! Vale a pena?

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  3. As pessoas não pensam no amanhã. Com certeza oq ele achava ser bom para ele naquele momento, se achando muito esperto por conseguir seguir seu time de coração, não odeixou pensar como o prejudicaria.

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  4. Ele foi irresponsável com a saúde dele, não pensando no amanhã

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